Com a cultura do cancelamento, estamos educando, punindo ou cortando os laços para sempre?

As marcas podem adotar posturas mais positivas ao lidar com creators que sofrem cancelamento, mas há certos limites

Quando se faz uma busca rápida pelo termo “cancelamento” no Google, os resultados apontam para uma mesma direção: exclusão de indivíduos.

“Não sou a favor do cancelamento nos moldes em que é feito hoje. Primeiro ele era educativo, depois punitivo, e agora mira no apagamento da história das pessoas”, afirma Raphael Dagaz, CEO da Dagaz Influencer.

A pesquisa “O Consumidor do Futuro 2020-2021” da WGSN, divulgada em 2018, já havia previsto a onda de ódio que se levantaria na internet.

Bem definido pelo especialista em marketing de influência, o cancelamento se apresenta em pelo menos três moldes.

Sendo eles…

O processo educativo, como primeiro, que pode ser interessante, se levantar debates sobre pautas urgentes e necessárias.

O segundo, como processo punitivo, esvazia de sentido o processo anterior, uma vez que muitos “canceladores” são meros reprodutores de ensinamentos da cultura social da qual tem origem.

Mas, com certeza, você já deve ter acompanhado uma porção de vezes, alguma personalidade perder patrocínios, parceiros e seguidores, após cometer um deslize, além de todo o linchamento virtual.

E por vezes esses acontecimentos culminam com a personalidade apagando suas redes sociais, indefinidamente. Essa é a terceira face desse fenômeno social: literalmente, a exclusão.

Neste ponto, apenas o erro tem ressonância. Toda a trajetória do “cancelado” pode, e por vezes vai, ser completamente ignorada.

O cancelamento também tem impacto direto sobre as marcas, uma vez que elas ocupam espaço dentro dos processos sociais, e seus consumidores desejam vê-las como agentes ativos desses processos.

Ou seja, vai haver cobrança sobre as empresas, sim! As marcas que não se posicionam podem ver indo embora todo um trabalho de conscientização, porque passam a perder a credibilidade que construíram.

Mas será que é só cortar a parceria com o creator cancelado?

As marcas podem e devem fazer mais! A começar campanhas nas redes sociais, levantando debate sobre as pautas em questão, mas não apenas isso.

Existe uma parcela de responsabilidade social, que recai sobre as marcas. É esperada uma postura ativa diante da cultura do cancelamento.

Quando o criador de conteúdo mantinha sua imagem intacta, havia interesse das marcas em amplificar seus discursos através dele.

Então, por que não usar o momento estrategicamente, para continuar a reforçar seus discursos afirmativos, mas agora apoiando criadores que traduzem essas pautas de forma a educar a sociedade sobre tais assuntos?

As marcas precisam refletir sobre como efetivar ações educativas tanto para a sociedade, como também para o criador de conteúdo.

Mostrar que se importam, que reconhecem que a desconstrução é um processo longo, e que estão dispostas a contribuir com o desenvolvimento daquele creator.

Então as marcas têm que apoiar todo mundo?

Há também o outro lado da moeda: defender o indefensável. As marcas precisam sim se preocupar com quem as representa e entender que há limites daquilo que se pode, realmente, “descancelar”

Não podemos esquecer o momento vivido por toda a equipe do Flow Podcast há algumas semanas atrás, em que o co-apresentador tenta justificar a existência de partidos nazistas com o fato de sermos politicamente regidos por um estado democrático.

Quando um crime, dessa e de outras naturezas, é cometido, o cancelamento não apenas se mostra como mais uma versão da violência, como também não resolve a questão.

Raphael Dagaz lembra que, para casos assim, existem competências específicas que investigam e punem os cancelados-criminosos com base na Lei.

O CEO da agência de creators conclui: “Se não faz mais sentido, é só pararmos de consumir o conteúdo daquele criador”.